Conselhos
para escritores são sempre bem-vindos. Serão, a seguir, citados dois deles. O
primeiro é de Yves-Marie-Joseph Congar (1904-1995), teólogo dominicano e
Cardeal francês: “Certamente todos os que escrevem querem ser lidos. Mas nem
sempre todos procuraram servir, pela pesquisa teológica, a vida dos homens e as
necessidades pastorais da Igreja” (1969, p. 29). Escrever é expressar, através
da escrita, o que se pensa. Escrever é grande responsabilidade, porque o
objetivo é transformar a mente do leitor, apostando que haverá mudança nele, no
modo de pensar e consequentemente no de agir. Escrever tema teológico faz com
que a responsabilidade aumente, pois o teólogo escreve sob o compromisso de ser
representante da palavra divina. A preocupação do teólogo católico, ao escrever,
é servir, por meio de sua pesquisa, aos seres humanos de um modo geral, e ao
que é pastoralmente necessário à Igreja. Congar, em 1966, reconhecia que a
leitura teológica estava despertando bastante interesse nas pessoas laicas: “...
o público cada vez mais largo quer interessar-se pela teologia e reclama que
esta seja escrita de modo a ser compreendida por ele” (CONGAR, 1969, p.
29). Este interesse cresceu consideravelmente, a tal ponto de, por toda parte, desde
aquela época, numerosos cursos de cultura religiosa, conferências de assuntos
teológicos ou círculos bíblicos serem administrados e seguidos por leigos,
costumeiramente sob a supervisão de uma autoridade eclesiástica. Isso demonstra
claramente que a teologia é um ponto de interesse para muitas pessoas.
O
âmbito católico faz com que a pesquisa teológica torne-se prazerosa para quem a
elabora, pois há um labor muito fecundo e rico de informações. Existe, no catolicismo,
a liberdade acadêmica, para que o pesquisador trabalhe com obediência, ciência
e arte, o que envolve a sua criatividade. Sabe-se que a teologia católica
ensinada nas universidades, seminários e escolas superiores traz, no seu
conjunto e nas suas disciplinas particulares, uma quantidade inimaginável de
material científico: nunca houve um tempo conforme o atual, no qual a produção
teológica fosse tão abrangente, sendo divulgada também por meio de revistas, de
livros, de editoras e de universidades que publicam, investigam e ensinam temas
teológicos. Duas questões podem ser ditas sobre isso. Primeiramente, há crítica
desta quantidade imensa de material. Entretanto, esta diversidade da Teologia
cristã não pode ser colocada a escanteio como uma mera carga histórica: a amplitude
dela é uma consequência necessária da pretensão de validade universal da fé
cristã. “Ao reconhecer a verdade de que Deus se manifestou na criação, na redenção
e na reconciliação como a origem e o fim do ser humano e do mundo, a teologia
está obrigada a não excluir, por princípio, nada como possível objeto de sua
reflexão” (MÜLLER,[1]
2018, p. 19). Em segundo lugar, às vezes, parece que
a Teologia católica se encontra em um beco sem saída, porque, particularmente, mesmo
com sua riqueza de conteúdo, parece que ter esgotado um importante paradigma aprendido,
especialmente, nos tempos do Concílio Vaticano II (1962-1965): o paradigma da
“comunhão”, o princípio sobre o qual se deve efetuar a reflexão teológica. Assim,
“os teólogos deixaram de ousar uma apresentação sistemática de todos os
tratados teológicos, preferindo antes uma especialização em determinadas áreas
de reflexão, mesmo devido à própria quantidade de produção científica” (MARTINS,[2]
2003, p. 19). Não é equivocado que se especialize em determinada área. Mas,
isto não deve fazer com que a pesquisa teológica fique fragmentada e perca sua
harmonia.
O
segundo conselho é de Délcio V. Salomon (m. 2013), filósofo e pedagogo
brasileiro: “Ninguém tem algo a escrever se não tem algo de novo a comunicar”
(2004, p. 34). Este é um universal critério da arte da escrita. Isto quer dizer
que apenas repetir não é qualidade para um escritor. É preciso que haja algum
tipo de novidade, nem que seja uma nova forma criativa de apresentar, através
da escrita, um assunto antigo. É preciso deixar claro que não se critica, neste
artigo, o uso de citações em uma pesquisa. Em uma citação literal, se a
passagem citada ocupa no texto um lugar esmerado, e se o discurso possui bom
nível, pertencendo à mesma qualidade do empréstimo, de tal modo que o faça
reviver, pode-se afirmar, sem medo de errar, que o escritor é original em sua
citação, pois se apropriou adequadamente das palavras que fez suas. Assim, de
acordo com Antonin-Gilbert Sertillanges (1863-1948), filósofo e teólogo francês,
“glorificando um outro, recebe uma glória semelhante. A citação é para você
como a palavra que o dicionário fornece e que entretanto você cria, como a alma
cria seu corpo” (2019, p. 149). O ancestral de todas as pessoas é a
verdade, e a sabedoria convida a todos. “Perante os gênios, somos apenas
crianças, mas crianças herdeiras. O que eles nos dão é nosso, pertence à
eternidade; também eles o receberam” (SERTILLANGES, 2019, p. 149).
Nesse
texto, a meta é comentar a relação entre o teólogo católico, a Igreja e a
academia. As ideias do autor serão enobrecidas com a citação de estudiosos que
contribuíram com assuntos ligados direta ou indiretamente ao tema da pesquisa. Toda
pesquisa reúne informações que visam encontrar solução para uma pergunta e
alcançar a resposta de um problema. Nesta pesquisa, o problema observado é que
a cultura que vivemos não tem simpatia pela palavra “verdade”, mas enaltece uma
liberdade praticamente sem limites para o ser humano. Neste contexto, como
podem os teólogos católicos exercerem seus papéis de educadores nas academias
ou nas próprias Igrejas, nas quais o pensamento dominante aderiu, ora mais, ora
menos, tal pressuposto contemporâneo?
[1]
Gerhard Ludwig Müller (n. 1947) é Cardeal alemão da Igreja Católica.
[2]
Nuno Brás da Silva Martins (n. 1963) é um Bispo católico português.
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